"A profundeza abissal da palavra declamada
ecoa nítida na linguagem abstrata
das mãos (gestos prontos),
e o atrito dos dias confunde as cicatrizes do tempo,
derramado sobre a mesa o poema
ignora nas pálpebras o pesadelo do sonho"

(Júlio Rodrigues Correia)





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5 de mai. de 2012

REDESENHAR



queria desenhar
mas preciso desdenhar
já que você não sentiu
falta do Roberto
mas deixou morrer as flores
do meu jardim
dentro de mim

queria desenhar
um barco
um arco
e nós dois no cais
mas sofri de ais
afogando-me
no azul do sonho
e de teu sono mais profundo
calado, seu silencio
e meu rosto mareado
um navegar salgado

queria desenhar
uma reta de arquiteta
um balaustre pra me jogar
como se fosse uma peteca
na cabeça cheia de penas
cores e mais cores
no pensamento
dentro das dores e penas
que tenho de mim

queria desenhar
o começo
que foi tão avesso
aquele fim sem ponto
um beijo e pronto
meu corpo esguio
minguando em sangue
como lama do mangue
de tanto engano

queria desenhar
as mãos tão lindas
mas os anéis não existem mais
os tapas foram cruéis
e nos distanciamos
igual sem linha
nos carretéis

queria desenhar
o meu sim e o teu
na promessa divina
de nós dois pra sempre
pra sempre, pra sempre
o eterno no universo
fostes perverso
e pecador e pecador

queria desenhar
teu sorriso
e minha dor
como linha rompida
o corte e a veia
e já uma velha
tão velha cicatriz

queria alguma coisa
redesenhar...


Cintia Thomé

maio 2012

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