"A profundeza abissal da palavra declamada
ecoa nítida na linguagem abstrata
das mãos (gestos prontos),
e o atrito dos dias confunde as cicatrizes do tempo,
derramado sobre a mesa o poema
ignora nas pálpebras o pesadelo do sonho"

(Júlio Rodrigues Correia)





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23 de jul. de 2010

SENTA AQUI...


SENTA AQUI...

Senta aqui do meu lado
Retire tuas asas, tuas unhas,
Teu casaco deixe na cadeira.
Escute só os nossos corações
O relógio parou
Só escutemos o coração

Senta aqui do meu lado
Deixe-me alisar teus cabelos
Não vamos repetir nada
Pois esta será a última atitude
Pois a escada no corredor
Já sente a dor de tua última presença

Senta aqui do meu lado
Escute a nossa respiração
Quase ínfima quase inaudível.
A emoção nem folego tem
Abra a janela, a pomba não está no parapeito.
A paz está indo com você

Não chore, pois eu não vou chorar.
O amor foi já tanto
Que penso só na felicidade de ter tido o possuir
Pranto agora seria macular
nosso amor tanto

Senta aqui do meu lado
Não olhe teu pulso, olhe pra mim.
Quero a tua imagem perpetuada
Olharei em teus olhos, teu corpo.
Não tens hora, mas sim o agora.
Não diga nada...

Levanta... Leve teu casaco.
Terás frio em todas as ruas
Sentirás nua a vida toda
A chuva virá espelhar o teu vidro
Será vidro marejado, turvo,
E nele vais lembrar que aqui
Também estará chovendo
E ao fundo ouvirei
O barulho do teu andar
Teus sapatos saltos a musicar
O adeus... Música que foi sumindo...
Sumindo...

Senta aqui do meu lado
Digo isso todos os dias, todos os anos...
Estarás bem? Estarás agasalhada?
Eu sei que estarás perdida,
O coração sem o bater,
Como as asas daquela pomba que se foi
E não as ouvi e nem vi mais
Apenas repito sem saber porque
"Senta aqui do meu lado, tire os sapatos”.



Cintia Thomé




Publicado no livro de Cíntia Thomé











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