"A profundeza abissal da palavra declamada
ecoa nítida na linguagem abstrata
das mãos (gestos prontos),
e o atrito dos dias confunde as cicatrizes do tempo,
derramado sobre a mesa o poema
ignora nas pálpebras o pesadelo do sonho"

(Júlio Rodrigues Correia)





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4 de jul. de 2012

SONHOS DECOMPOSTOS








Os grãos de mostarda voam

soltos, revoltos vão as cavernas

os labirintos das veias, as artérias do ontem, dos séculos

voam a chibatadas do vento

num sopro de velas mal comidas

no frio do ventre sem espumas de amor

quebram parafinas das intermináveis novenas

e agora? nunca!

Devolva a Terra o meu sangue

perdido no tempo da promessa

das ilusões sentimentos nobres, das bocas articuladas

cuspindo fétidos perfumes, mau hálito das ervas

sonhos decompostos deste sorrateiro ser

fantasma dos meus passados

a agulha, seu dente que feriu-me

boba, quase adolescente, em rouge pálido

sangrou corpo e o apaguei na memória

vieste a lembrança das antigas mágoas

como água vi meus olhos rasos

impedi a verdadeira estória

na solicitude de reflorescência honrosa,

sem vírgulas e pontos

em caixas de pandora, em laços já desfeitos?

corre vazio de agora a dúvida sem sabê-la

sem começo vai leve como folha quebrada

desmaiada desintegra quase pó

por que já a hora aproxima-se

e leva a docilidade de mim

sem que fizeste estancar a ferida

no incerto, no duvidoso não tenhas feito nada

só ilusões e mentiras

você vocifera no canto desse coração

por que não pronunciei palavras

de culpa para ver nossas asas livres

não indague, não tenho respostas

leva ao firmamento em seu pensamento

é tudo que resta, restou até o completo desaparecimento

é a estrela que brilha ao miolo das flores

no talo alto que ali lamento, das rosas dos ventos...

dos ventos, dos ventos

Cíntia Thomé

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